Profissionais abordaram similaridades e diferenças entre o uso do recurso no Brasil e na Austrália
Para trazer luz ao tema mediação, a Associação Internacional do Direito do Seguro – AIDA Brasil – realizou uma live organizada pelo GNT de Solução de Conflitos na última segunda-feira (22), com o tema “Mediação nos contratos de seguro e resseguro l Um paralelo entre Austrália e Brasil”. Na ocasião, especialistas da área discutiram os pontos em comum e as disparidades referentes a prática nos dois países.
O debate teve as participações do presidente da instituição, Juliano Ferrer, da presidente do GNT de solução de conflitos, Viviane Teodoro, da especialista em mediação em seguros e Resseguros, Vivien Lys Porto e Melissa Cunha, membro da AIDA. Também contou com a presença ilustre do presidente do Grupo Internacional de Trabalho de Solução de Conflitos da AIDA mundial, Christopher Rood, que compartilhou informações relevantes sobre mediação na Austrália, país com vasta experiência e considerado referência no assunto.
Em sua apresentação, o executivo abordou o histórico da mediação, a eficácia dessa alternativa e conceitos. Falou sobre o modus operandi do processo de mediação australiano e sua importância para desafogar o sistema. Também apresentou dados/relatórios, prós e contras, contextualizou e trouxe a sua visão pessoal sobre o tema.
Na Austrália, a utilização do recurso não é uma exceção, mas sim uma regra e a primeira opção. Tanto que muitos juízes não listam um processo para julgamento a não ser que as partes estejam dispostas a primeiramente atender a uma sessão de mediação. Lá, a mediação passou a ser utilizada como um processo para a solução de disputas em meados dos anos 80, no Estado de Vitória, sendo inicial+mente pro bono para incentivar a sua popularização. Uma das regras definidas pela suprema corte para a mediação é que antes de ir a julgamento as partes devem atender a uma sessão de mediação. Outra diz respeito à obrigatoriedade de comparecimento. “Caso uma das partes não compareça a audiência, a mesma deverá pagar os seus custos. As partes são obrigadas a comparecer a sessão, mas não são obrigadas a entrar em um acordo”, explica o especialista.
Durante sua apresentação, Rood também compartilhou algumas descobertas importantes extraídas do Relatório intitulado “Mediação nos Tribunais Supremos e Condados de Victoria”, que foi publicado em 2009. Analisando o levantamento, o magistrado verificou que 100% das pessoas que responderam à pesquisa afirmaram que o recurso contribuiu para estreitar as relações na disputa.
Dentre os casos analisados, 25% das mediações resolveram disputas complexas que de outra forma teriam precedido uma audiência completa. Pelo menos 43% dos entrevistados relataram que a disputa foi resolvida na mediação e o recurso estreitou as questões que estavam sendo disputas. Quanto ao nível de satisfação dos participantes de processos de mediação o percentual chega a 81%. De maneira geral a taxa de solução de conflitos, por meio da mediação, gira em torno de 45% a 65%, e em 82% dos casos o recurso significa uma economia muito grande. Para o sistema, a redução de custos é de aproximadamente U$ 50mil.
Em contrapartida, na maioria dos casos os processos de mediação foram considerados muito curtos, em torno de duas horas. E em muitos deles, os participantes se sentiram como se estivessem em uma competição e não em uma sessão de mediação. “Não me importo com o compromisso, mas não acho que a mediação deva ser competitiva. Acho que as partes precisam pensar em comprometer suas posições”, disse o palestrante.
Conforme mostrou o relatório, 67% dos que resolveram suas questões via mediação se sentiram pressionados a resolvê-las. Menos da metade dos mediadores parecia seguir qualquer modelo padrão da indústria e uma proporção significativa não ouviu as partes nas declarações iniciais. 47% afirmaram não se sentirem confortáveis com o processo e 59% afirmaram que gostariam de ter uma participação maior. No caso de questões de danos pessoais, as partes que reclamam se sentiram impotentes e muitas vezes pouco envolvidos no processo.
O profissional entende que a mediação introduziu outro processo para a resolução de litígios na área jurídica. “Existem tantas mediações sendo realizadas que o processo se tornou apressado e mecânico, o que desestimula muita gente. Em muitos casos as sessões de mediação são na verdade tratadas como uma reunião de avaliação. Uma oportunidade para os advogados avaliarem os pontos fortes e fracos das partes antes de ir a julgamento”, ponderou. O fato de que na mediação a remuneração é baseada no no win no fee é um ponto de atenção é, visto que os profissionais só recebem quando ganham a causa, o que desestimula as mediações por parte dos advogados.
Com o aumento da demanda na Austrália a mediação e a arbitragem se tornaram partes fundamentais do processo legal para a resolução de litígios. Christopher Rood se diz um grande incentivador e apaixonado pela mediação e acredita que essa é uma excelente alternativa para a resolução de disputas e conflitos. “A mediação é mais barata, mais rápida e menos conflituosa do que um julgamento. Nela, as partes é que são responsáveis pela decisão, não o juiz ou o júri. Outro ponto positivo é que as negociações entre as partes permanecem confidenciais”, destacou.
Visão Nacional
Vivien Lys Porto iniciou seu painel endossando que, como apontou Christopher Rood, a mediação é muito mais barata, mais rápida e causa menos litígio. “Mas nosso país ainda está engatinhando em relação à mediação aplicada ao mercado de seguros”, pontuou a executiva, reforçando que no Brasil, esse tem sido um dos maiores pontos para aqueles que já encaminharam seus conflitos, seja segurado, segurador, corretor, cliente, resseguradora.
De acordo com a debatedora, são muitos os feedbacks positivos nas mediações que acontecem em sua área de atuação, por parte dos mediandos. “Na mediação exploramos os pontos fortes e os fracos de ambas as partes no conflito. Ao contrário do que o Cris apresentou, que lá na Austrália às vezes a mediação acaba sendo mais um processo de avaliação, para analisar os pontos fortes e fracos, aqui no Brasil nós não temos essa tendência de uma mediação analítica”, enfatizou.
No Brasil, temos mediações que acontecem em sinistros negados, nos ramos de seguro de vida, seguro de auto, em que nós verificamos que esse tipo de abordagem dos pontos fracos e fortes, dentro de um cenário confidencial, tende a ser mais bem trabalhado em uma mediação do que em um processo judicial ou em uma arbitragem.
Vivien defende que a mediação serve para reformular o conflito. Se inicia de uma forma e termina em uma posição completamente diferente. “E isso é esclarecedor para todos aqueles que participam da mediação. A mediação aplicada aos contratos de seguros e resseguros é um ponto que vale o alerta e o aspecto positivo dessa construção”, analisou.
Na visão de Vivien, a mediação proposta em seguros pode crescer muito ainda aqui no Brasil, porque assim como na Austrália, nós tivemos um grande aumento da judicialização. Porém, ao contrário do que acontece lá, onde o recurso tornou-se essencial ao processo judicial, aqui ele acaba sendo apenas mais um passo. “A minha orientação é que o mercado de seguros comece a incorporar a mediação como uma ferramenta de solução de seus conflitos, para que o setor cresça, ainda mais, e poupe despesas com processos”, concluiu.
Assista a live completa no canal da AIDA: