Mercado de franquias aquecido em meio à pandemia

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por Rodrigo Damásio de Oliveira (*)

Com a onda de demissões decorrente da pandemia do Covid-19, uma parcela significativa da população demonstra interesse em investir economias e/ou multas rescisórias nos mais variados tipos de franquias como fonte de renda.

As microfranquias, cujo investimento inicial é de até R$ 90 mil, viram crescer nos últimos meses o número de interessados, venda de unidades franqueadas e o lançamento de modelos com esse perfil por parte de redes tradicionais. A procura nos meses de maio, junho e julho cresceu 14% em relação aos três anteriores, segundo um levantamento da ABF (Associação Brasileira de Franchising).

Algumas redes registraram aumento de até 63% nas vendas de unidades. Porém é um equívoco encarar a aquisição de uma, ou mais, unidades de uma franquia como a panaceia para todos os males financeiros. Muitas vezes interessados em franquias imaginam que é preciso apenas contar com o capital inicial necessário, adquirir uma unidade que se adeque ao seu bolso, e com a ajuda do franqueador em sua implantação, ela se torna uma verdadeira máquina de fazer dinheiro.

É importante notar que no Brasil, apesar do interesse e da quantidade, não há uma legislação específica que regule a relação entre empresas cujo modelo de negócios é o de franquias. Não há hierarquia entre franqueado, aquele que contrata o direito de utilizar a marca e o seu know-how, e franqueador, aquele que licencia seu modelo de negócios. Mas em situações de crise, o primeiro até agora se via inteiramente nas mãos do segundo.

Em caso de pedido de recuperação judicial, aquele “respiro” que a Justiça confere às empresas com problemas financeiros, que consiste em um período de 180 dias no qual se interrompe o pagamento de suas dívidas enquanto o franqueado reorganiza finanças e negócio, o cenário comum é o do franqueador cessar o fornecimento de insumos ao franqueado que passa por dificuldade.

Como há uma obrigatoriedade do franqueado de comprar os produtos que comercializa ou insumos necessários ao negócio exclusivamente do franqueador, na prática o destino de sua unidade da franquia está selado. 

Para piorar, a dívida para com o franqueador continuará existindo, aumentando o drama de quem via na franquia um negócio infalível. Em meio à pandemia, surgiu um par de novidades que conferem maior segurança jurídica aos interessados em adquirir uma unidade e aqueles que já são franqueados. Mas, em ambos os casos, é necessário estar atento às novas regras para colher os benefícios.

Primeiro, entrou em vigor a Lei 13.966/19 que imprime maior transparência da parte dos franqueadores em relação ao COF (Circular de Oferta de Franquia).

A nova legislação exige que o documento inicial entregue pelo franqueador aos interessados traga informações detalhadas sobre direitos e deveres de cada uma das partes: Detalhamento de mensalidades e outras taxas, as respectivas bases de cálculo de reajuste, obrigatoriedade do franqueado em adquirir cotas mínimas periódicas de bens, insumos ou serviços necessários à operação, e a relação completa dos fornecedores.

É imprescindível ler as “letras miúdas”, pois em certos casos o contrato com o franqueado confere ao franqueador poder para definir a localidade da nova unidade a ser aberta, mesmo que traga risco ao negócio e aos funcionários, e o poder final de veto à mudança de local. No caso de momentos de crise, o documento agora tem que descrever qual o tipo de suporte oferecido pelo franqueador e indicação da existência, ou não, de regras de transferência ou sucessão de propriedade da franquia.

Outra novidade positiva para o franqueado foi a decisão da juíza Anglizey Solivan de Oliveira, da Vara Especializada em Falências e Recuperação Judicial de Cuiabá (MT). Ela determinou, com base no artigo 47 da lei 11.101/2005, que trata de recuperações judiciais, que um franqueador da área de cosméticos, produtos de perfumaria e higiene pessoal daquele Estado mantivesse o fornecimento de seus produtos por 180 dias para permitir que um franqueado, que entrara com pedido de recuperação judicial por causa de dificuldades financeiras, pudesse manter seu negócio funcionando até apresentar aos credores seu plano de recuperação administrativa e financeira. A proposta pode, ou não, ser aprovado pelo franqueador, que é o principal credor.

Com a decisão da juíza, a recuperação judicial passa a ser alternativa da qual o franqueado poderá lançar mão para salvar seu negócio a partir de agora.

Não deveria ser novidade, mas sim o normal, já que preserva a cadeia produtiva, empregos, e aumenta as chances de o principal credor, o franqueado, receber o valor devido. As principais características da recuperação judicial é que a mesma ação contempla todos seus vários credores e ela não questiona os débitos, ela “olha para o futuro”. Por outro lado, trata-se do último passo antes de um eventual pedido de falência, o que tem que estar claro antes que uma decisão seja tomada.

O franqueado tem outra linha a seguir, que é a discussão em uma vara comum para questionar a forma como chegou às suas dívidas, instância na qual poderá contestar juros fora da realidade do mercado ou cláusulas abusivas, por exemplo. Nesse caso, a ação “olhará para o passado” e cada uma das ações terá que ser instituída individualmente em relação a cada credor e poderão acontecer decisões diferentes.

O franqueado poderá buscar a ajuda de um profissional especializado em administração judicial, preferencialmente com formação em contabilidade, ao deliberar qual caminho pretende seguir (ação em vara cível ou recuperação judicial).

Há um outro cenário que pode acontecer, que é a insolvência do franqueador. Nesse cenário, à princípio, o franqueado pode buscar novos fornecedores para dar continuidade ao seu negócio, ao mesmo tempo em que se habilita como credor do franqueador.

É importante o interessado em uma franquia verificar, antes de fechar com o franqueador, no COF mesmo, se há previsão de multa caso o franqueador esteja impossibilitado de fornecer os produtos, insumos ou serviços.

(*) Rodrigo Damásio de Oliveira é Perito Judicial Contábil especializado em Administração Judicial, desde 2001 contribui com o equilíbrio da justiça, auxiliando mais de 350 Juízes em todo o Estado de São Paulo, sócio da Damásio Consultoria e Recuperação Judicial, atua em processos de Falência e Recuperação Judicial

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